domingo, 3 de abril de 2011

OS AMIGOS DO VIAGRA

Essa matéria foi publicada hoje (2/04/2011) no Caderno de Esporte do Jornal o Globo (última página) e tb no site do O Globo na internet (www.oglobo.com.br/esportes).
É sobre a pelada que jogo todo sábado em Vargem Grande. Imperdível a leitura.

Distensão no fígado? Língua afiada? Pé torto? Canela de vidro? Problema de junta? Há 16 anos, quando nasceu a pelada organizada pelo micro empresário Jeremias Mazzaro de Abreu, o Jerê, problemas médicos não assustavam ninguém. A maioria dos participantes era representante de laboratórios farmacêuticos ou donos de drogarias. Havia remédio para tudo. Mas foi na resenha, após algumas doses a mais de conhaque Dreher, que um atleta veterano, cabisbaixo, perguntou se a rapaziada também distribuía amostra grátis do azulzinho. Namorada nova, ele não dava conta do recado e ainda tinha câimbras durante a relação. Dessa forma, o time foi batizado de Grupo dos Amigos do Viagra (GAV).
- Consegui um estoque para ele, mas acho que era um caso perdido – lembrou Waldo Silva, o Perigoso, dono da Farmanossa, em Quintino. Nunca mais ouviram falar do senhorzinho e muita água rolou de lá para cá. O nome do time foi mantido até porque o remédio tem sido um parceirão de alguns jogadores cansados de guerra. Mas o grupo foi totalmente renovado por Jerê e todos os sábados, a partir das 9h, na comunidade do Pombo Sem Asa, em Vargem Grande, o campo recebe craques dos mais variados bairros e profissões. Tem mecânico de máquina de lavar que declama poesia, policial civil, advogado, cozinheiro, técnico em informática, distribuidor de bebidas, aposentado, motorista, contador, empresário, segurança, funcionário público, dono de açougue e......
- Caloteiro! Tem o 171 do Tony! – denunciou Marcelo Faro, o Rolha.
Segundo ele, o companheiro de time passa regularmente em seu açougue, o Faro da Piedade, com a missão de comprar carne para os churrascos mensais e apesar de ter o dinheiro arrecadado na pelada sempre pendura a conta. No mês passado, sem conseguir receber, Rolha contratou um carro de som e foi até a Abolição, bairro de Tony, para cobrá-lo em alto e bons decibéis. Os policiais Max e Gouveia ouviram as reclamações em silêncio e o poeta Cláudio de Vasconcelos, o Caio, declamou frases de amor para acalmar os ânimos.
- Essa mistura de harmonia com esculhambação é que nos traz aqui todos os finais de semana – revelou Márcio Mattos, braço direito de Jerê e um dos 16 fundadores da pelada. Durante o jogo, o forró comia solto no Bar do Campo. Reyes de Sá Viana do Castelo, da equipe do A Pelada Como Ela É, DJ e especialista em baladas sertanejas, depositou algumas fichas na maquininha musical, pediu uma gelada e aumentou o som para Zezé di Camargo e Luciano. Saía faísca no racha e Chorão, o melhor do time, foi expulso. Deu um tapa no boné do juiz e quase teve briga. Há dois anos afastado por conta de uma contusão, Luiz Raí, apareceu por lá e, da arquibancada, comprovou que tudo continuava igualzinho. Durante o jogo, uma dúvida. Ninguém atuava pela lateral esquerda. O advogado Luiz Claudio, o Cadola, explicou o macabro motivo.
- Como recentemente morreram um lateral direito (funcionário público), um central (desempregado) e um quarto zagueiro (taxista), todos têm medo que possam ser “convocados” para completar a defesa do time de São Pedro, pode isso?
Pouco antes de o jogo terminar, Dona Dada abasteceu a mesa da resenha com batata, costela e feijão. Ivo, o Galo Cego, salva vidas aposentado, se aproximou do alambrado e pediu água com gás. Era sua vez de pedir socorro. Segundo seus cálculos salvou cerca de 2 mil vidas. Alguns amigos acenaram por trás negando a informação. No fim da partida, Renê, de 62 anos, o mais velho do grupo, comemorou a vitória sobre o time de Douglas, de 29, o mais novo. Na cervejada, Rolha esqueceu da dívida e saboreou a picanha com o “inimigo” Tony, o zagueiro Jorge Chapa, vulgo Brinquedo Assassino, era um carinho só com os amigos e Josias Tartaruga Ninja, o juiz, ria com Chorão. Jerê, líder do Grupo do Viagra, não é médico, bruxo ou consultor sentimental, mas descobriu a fórmula para manter saudável e fogoso um casamento de tantos anos, onde a relação só pode ser discutida numa mesa barulhenta e regada de muita cevada
Abraços,
Sérgio Ricardo.

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